Baracoa, Cuba, 16 de abril de 1895.
Carmita querida e meus filhos:
Escrevo-lhes após ter chegado a uma praia de pedras e de espinhos. Éramos seis e estamos a salvo neste acampamento feito entre palmeiras e plátanos. No caminho recolhi para ti, Carmita, a primeira flor, e para Maria e Ernesto, pedras coloridas; as recolhi como se fosse vê-los logo, como se não me esperasse esta lona mas sim a casa, aconchegante e generosa, que sempre tenho diante de meus olhos.
É muito grande, Carmita, minha felicidade. Sem
ilusões nem alegria egoísta, posso dizer-te que cheguei à minha natureza mais
plena, e que a dignidade que vejo em meus companheiros e a honra de estarmos
lutando pelos nossos direitos, me envolve como uma doce embriaguez. Somente a
luz é comparável a minha felicidade. Porém a todo instante estou vendo teu
rosto, piedoso e sereno, e aproximo meus lábios da face das crianças, quando
amanhece, quando anoitece, quando me aparece no caminho uma flor, quando vejo a
formosura destes rios e montes, quando bebo, fincado na terra, a água clara do
arroio, quando fecho os olhos, contente de mais um dia em liberdade. Vocês me
acompanham e me rodeiam; os sinto, calados e vigilantes, ao meu redor. A mim só
vocês me faltam mas a vocês, o que faltará? De cada angustia, de cada
ansiedade, de cada medo, como estão se salvando? Como repor a ajuda que não
estou podendo lhes dar? Cuba já tem escrito seus nomes com meus olhos em muitas
nuvens do céu e em muitas folhas de árvores.
Meu sentido de homem útil faz ainda maior o pesar de
não estar com você Carmita, com vocês meus filhos. Recordarão vocês de mim com
a mesma veemência e lealdade com que eu os recordo?
Ah, Carmita, se me visses por estes caminhos,
contente e pensando em ti, com um carinho mais suave e forte do que nunca,
querendo colher para ti, sem correio que possa mandá-las, estas flores de
estrelas, molhadas e brancas, que crescem aqui nestes montes...
Vou bem carregado, minha querida, com meu rifle ao
ombro, meu facão na cintura, um grande tubo com os mapas de Cuba, nas costas
minha mochila, com remédios, roupa, uma rede, livros, e no peito, o teu
retrato.
O papel está acabando e o correio não pode ir muito
pesado. Escrevo com todo o sol sobre o papel. Vejam-me vivo e forte, e amando
mais do que nunca aos companheiros de minha solidão e medicina de minhas
amarguras. Daqui não temam. As dificuldades são grandes mas os que hão de
vencê-las, também. Manoel, trabalha. Carmita, escreva para mamãe. Carmita e
Maria, minhas filhas, se eduquem para a escola. Uma palmeira e uma estrela vi
lá no alto, sobre o monte, ao chegar ontem aqui. Como não haveria de pensar em
vocês meus filhos, e em você, querida, ao ver o límpido céu da noite cubana?
Queiram bem ao seu
Martí.
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